STATCOUNTER

Um espaço para que pesquisadores nas Ciências Humanas discutam suas idéias, seus projetos, suas análises.

Friday, June 29, 2018

Estatinas e o risco de morrer de câncer da próstata

Uma pesquisa recente feita na Finlândia trouxe informações a respeito das associações (ou não) entre o uso de estatinas e o risco de morte por câncer da próstata. É uma pesquisa que somente poderia ser feita em poucos países com excelentes bases estatísticas que são compatíveis. Analisaram 6.537 homens com câncer da próstata, acompanharam esses homens durante sete anos e meio e cruzaram as informações com o banco de dados que contem informações sobre o uso de medicamentos, no caso estatinas.

Durante o período em que os acompanharam (NÃO é o mesmo que o tempo desde o diagnóstico), morreram 617 pacientes.

A que conclusões chegaram? 

A primeira não ajuda quem já usava estatinas antes do diagnóstico do câncer. Não há associação entre o uso e a morte pelo câncer.

A segunda conclusão é muito diferente. O uso de estatinas DEPOIS do diagnóstico é o que conta. Reduz o risco de morte devida ao câncer (HR 0.80) e quanto mais estatinas usaram (suponho que dentro dos limites estabelecidos pelo médico), maior a redução.

A redução era mais clara entre os que usavam terapia hormonal e menor entre os que fizeram cirurgia e/ou radiação.

Deixo claro que há vários estudos sobre essa associação e nem todos mostram uma redução na mortalidade com o uso de estatinas.

GLÁUCIO SOARES iesp-uerj

Saiba mais:

Murtola TJ, Peltomaa AI, Talala K, Määttänen L, Taari K, Tammela TLJ, Auvinen A., Statin Use and Prostate Cancer Survival in the Finnish Randomized Study of Screening for Prostate Cancer. Eur Urol Focus. 2017 Apr;3(2-3):212-220. doi: 10.1016/j.euf.2016.05.004. Epub 2016 Jun 2.

Tuesday, June 26, 2018

A FIFA

Há quatro anos, por ocasião da Copa de 2014, fiz uma pesquisa secundária sobre a FIFA. A história da FIFA revela, para mim, três aspectos muito negativos: era uma instituição oligárquica e autoritária; era uma instituição corrupta, pessoal e institucionalmente, e era uma instituição eurocêntrica. Era, também, um momento com muitas manifestações de rua capitaneada por jovens estudantes contra o aumento das passagens de ônibus, criticando, também, os exagerados gastos com a contrução de estádios desnecessários e a realização da Copa do Mundo no Brasil.

Quanto mudou, de lá para cá? Não sei. O então presidente, Joseph Blatter, foi afastado por corrupção. Talvez o nível da corrupção tenha sido muito reduzido. Não sei.

A pesquisa gerou um artigo, “Bilhões x centavos”, que reproduzo:

Organizações internamente oligárquicas e autoritárias, como a Fifa, convivem mal com países democráticos. Algumas das bandeiras levantadas pelos manifestantes, que estavam presentes nas redes sociais há tempos, se referiam à conveniência (ou não) de realizar copas e olimpíadas quando faltam recursos para a infraestrutura, o transporte, a educação e a saúde. Há alguns pontos relacionados aos eventos esportivos internacionais que o Brasil sedia e sediará que são perturbadores e podem levantar novas bandeiras e alimentar novas manifestações. É um ninho de vespas esperando ser tocado.

A Fifa é uma organização democrática? Julgue você: ela foi fundada em 1904 e teve oito presidentes até agora (2014), com uma permanência média de 13,6 anos no poder. É muito. Jules Rimet, cujo nome marca a taça das Copas Mundiais, presidiu a Fifa durante 33 anos. Três ocupantes morreram na presidência. A presidência da Fifa revela sua origem eurocêntrica. Dos oito presidentes, sete eram ou são europeus. Nosso conhecidíssimo João Havelange, até agora, é a única exceção (atualização feita em 2018: oito em nove são europeus). Teve o inegável mérito de globalizar o futebol e a Fifa, contra, diga-se de passagem, os protestos de muitos europeus. Porém, ele também teve um extenso reinado, de 24 anos, marcado por acusações de corrupção. O atual presidente, Blatter (era o presidente em 2014), assumiu em junho de 1998. Já completou quinze anos na presidência.

Esse caráter autocrático, com concentração de poder e número ilimitado de reeleições, marca muitas associações esportivas, nacionais e internacionais. O próprio Havelange, quando presidiu a CBF, permaneceu 23 anos. Roberto Teixeira, que saiu pouco antes de 2014, outros 23. E há problemas de nepotismo e corrupção. Ricardo Teixeira foi casado com a filha de João Havelange, Lúcia. Outras organizações esportivas, nacionais e internacionais, também se caracterizam por extensas permanências dos que ocupam os cargos mais altos e por empregar parentes e amigos de seus presidentes ou diretores.

Organizações internamente autocráticas convivem mal com países democráticos. Segundo o “The Sun”, Jérôme Valcke, secretário-geral da Fifa, afirmou que era mais fácil lidar com um líder forte, como Putin, do que com países democráticos, como a Alemanha. Blatter foi mais longe: afirmou que a Copa de 1978, na Argentina, foi uma forma de reconciliar os argentinos com o sistema político. Como sabemos, era uma ditadura militar. No dia 2 de outubro de 1968, ocorreu um massacre em Nonoalco-Tlatelolco, no México. Havia uma manifestação, como as no Brasil, lideradas por jovens. As forças repressivas abriram fogo. As estimativas do número de mortos variam entre 30 e 300. Menos de dois anos depois o México, ainda presidido por Diaz Ordaz, sediou as Olimpíadas e, em 1970, a Copa.

Alguns desses problemas são debatidos no mundo dos esportes. Os presidentes das associações dinamarquesa e alemã, Allan Hansen e Wolfgang Niersbach, criticaram a recusa da Fifa a discutir temas como a idade limite e a duração dos mandatos.

Os presidentes e altos funcionários ficaram e ficam por abnegação? Por altruísmo?

É difícil acreditar. Ninguém sabe quanto ganha Blatter. A Fifa não revela. Em maio deste ano, Mark Pieth, um advogado suíço, exigiu que a Fifa revelasse o quanto ganham os membros da sua hierarquia. Segundo a organização The Richest (http://www.therichest.org), o patrimônio de Blatter seria de dez milhões de dólares; Blatter teria admitido que seu salário era de £ 598.000 em 2010, cerca de dois milhões de reais ao cambio de junho de 2014.

A Fifa vive de eventos. Uma estimativa nos dá 87% das suas receitas neste quesito. Tem deixado a receita das entradas e ingressos para o país sede. Ajudou a África do Sul com 500 milhões de dólares, muito pouco, considerando os gastos do país com a construção e a reconstrução de estádios, a custosa melhoria dos transportes para os estádios, aeroportos e áreas de turismo, e segurança. O “New York Times”, no dia 20 de junho, foi enfático ao afirmar que “nem a Fifa nem o Comitê Olímpico Internacional financiam os estádios multibilionários, nem pagam pela infraestrutura, o policiamento... Mas são a Fifa e o COI que [recebem] os bilhões da receita das televisões”. Até os direitos televisivos e de marketing são reservados para a Fifa. Eles são o filão das copas. Quanto rendem? A Fifa fica com eles. Assinou um contrato com a ABC/ESPN para a transmissão de seus eventos de 2007 a 2014 somente na língua inglesa: 425 milhões. É um monopólio assegurado pela lei (nº 12.663 de 5/6/2012, Seção III, Art. 12).

O orçamento da Fifa para 2011-2014 estima uma receita de quase quatro bilhões de dólares. Feliz com esses resultados, Blatter aumentou a contribuição da Fifa para as seis confederações regionais: dois milhões e meio para cada uma. Aumento pequeno. Quinze milhões, no total, ou menos de 0,004% do mencionado orçamento.

Há um contraste entre o caráter autocrático da Fifa, as frequentes acusações de corrupção a seus próceres, suas altas receitas, os salários não revelados dos seus dirigentes, e os ideais modestos, socialmente igualitários e contra a corrupção dos manifestantes jovens e éticos fora dos estádios.

GLAUCIO SOARES


25/06/2013 9:11
Leia mais: https://oglobo.globo.com/opiniao/bilhoes-centavos-8803470#ixzz5J0fxyR8u
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